Músico vítima de chacina em Belford Roxo é enterrado ao som de roda de samba


Matéria escrita por Geraldo Ribeiro e publicada no G1 Rio em 01/07/2019.

Amigos atenderam ao pedido do percussionista, uma das quatro vítimas do crime

No dia 17 de abril, o percussionista Jorge Victor da Silva Ribeiro, de 23 anos, compartilhou numa rede social uma postagem sobre o enterro de uma mulher, que, atendendo ao apelo dela, foi à base de muita música e alegria. Ele escreveu que queria o dele assim. Amigos músicos fizeram sua vontade. O corpo do rapaz, um dos quatro mortos na chacina ocorrida neste sábado, no bar Rei do Peixe, no Centro de Belford Roxo, na Baixada Fluminense, foi sepultado no começo da tarde desta segunda-feira, no Cemitério Municipal de Nova Iguaçu, ao som de samba.

Uma animada batucada foi organizada por seus amigos. Alguns deles estavam tocando com o percussionista no Rei do Peixe, onde ocorreu o crime. Sambas-enredos do Salgueiro, sua escola de coração, e músicas de bambas, como Jorge Aragão, Paulo César Pinheiro, Candeia e Fundo de Quintal, fizeram a trilha sonora do cortejo.

— Foi um pedido dele. Ele amava o que fazia e queria isso. Foi o último pedido dele — confirmou Dhandara Cristina, mulher do músico.

A viúva contou que o marido perdeu recentemente dois amigos músicos e isso o preocupava. Ela estava com o marido na hora do crime. Dhandara contou que foi tudo muito rápido e só deu tempo de abaixar para proteger o filho do casal, de 6 meses, que estava com ela.

— Eu não vi o momento que aconteceu, porque abaixei com meu filho. Mas foi horrível. Tanto que quando fui achá-lo, ele só olhou para mim com uma lágrima, apertou minha mão e fez um barulho que estava ali. Ele queria saber se eu estava bem — afirmou.

O corpo do músico Jorge Victor foi enterrado na tarde desta segunda-feira Foto: Cléber Júnior

Os amigos que organizaram a roda de samba dizem que guardam do amigo uma imagem boa, de uma pessoa que morreu trabalhando e que tinha amor à música.

— Tristeza não combinava com ele. É a maneira que ele queria (o enterro). Jorge era só alegria. Nunca o vi triste. Não fumava nem fazia nada errado. Era um cara do bem — definiu o panderista Anderson Shock, de 29 anos, seu colega na banda Nosso Grupo.

Anderson contou que estava numa posição oposta a do amigo no pequeno palco do bar e, por isso, escapou. Jorge estava na outra ponta. O percussionista era músico de apoio da banda, mas era figura constante nas apresentações.

A família contou que a música entrou na vida de Jorge Victor ainda na infância. Pequeno, já batucava nos móveis e, aos 7 anos, ganhou o primeiro pandeiro. Aos 13, dizia que queria ser músico profissional.

Ao fim do enterro, um amigo do músico reclamou da violência:

— Quem mora hoje no Rio de Janeiro não vive, sobrevive. Estamos todos entregues a tudo isso. É isso aqui que você está vendo, um silêncio de dor. Se a gente procurar saber, não tem resposta de nada nem de ninguém — lamentou o músico Renan Oliveira.

Outra vítima da chacina, Fabrine Rejane Marques, de 25 anos, será sepultada às 16h30 também no Cemitério Municipal de Nova Iguaçu.

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